sábado, 24 de julho de 2010

"Insustentável Esperança"

A sensação era a de que aquela rotina quase sufocante fosse tomar conta mais uma vez. Parecia também que meu ser se distanciava cada vez mais dos demais, e não no sentido aristocrático da coisa, mas no sentido "espiritual-sentimental", até que ponto meus medos e temores para com os demais se tornaria realidade.
A esperança depositada nos demais não mais se sustentava completamente, e a possibilidade disso se tornar absoluto era assustadora.
A angústia se atrevia a se mover.

De repente apresenta-se algo discretamente querendo atrapalhar a rotina e o ciclo viciante. Em mais uma viagem no coletivo, um ser postava-se logo mais a frente. Fazia uma diferença sublime na grande indiferença do universo, não dava para saber se era real. Dificilmente faria uma diferença significante na minha passagem. Mas por surpresa ela continuou reaparecendo, não mais parecia uma névoa que à menor inconstância desapareceria para sempre. Sua aparência tomava uma solidez, mas que se limitava até o ponto em que não podia ser tocada, senão desmancharia, sua perfeitabilidade seria afetada ao menor toque, seria atirada às imperfeições materiais e seria como que arrancada da metafísica que a circundava.

No entanto, semanas mais tarde, projetava-se a oportunidade de visitar um lugar que se deslocava do convencional contanto que se comparasse com o convencional de fato.
Consegui me estabelecer com um par de pessoas que se aproximavam do meu jeito, a ponto de não ser obrigado à convenção social no geral.
Mas apesar disso, o lugar começou a me instigar um tremendo mal-estar. Aquelas pessoas que tentavam se afastar da convenção que eram alvo de uma esperança continha minha, tornavam-se "mais do mesmo". Estes ficavam à margem da sociedade mas não à margem da convenção, no final das contas era uma falsa tentativa de se superarem, mas diferentemtente, havia uma certa conformação, e os que mais se aproximavam da superação, ficavam presos por certas barreiras como o medo ou a preguiça.
Aquela angústia voltara.
O sentimento de solidão era consequência disto tudo.
Mas desta vez não existia garota alguma que pudesse apoiar toda esperança desorientada.
A garota do ônibus representava a idéia de superação que definitivamente corroeu-se por inteiro naquela noite.

terça-feira, 20 de julho de 2010

"Um ponto de vista"

Era mais um final de semana onde eu procurava algo diferente para fazer.
A noite havia chegado e mais do que antes, eu sentia a necessidade de fazer algo ao ar livre, de respirar o infame ar urbano, mas ao mesmo tempo, aproveitar para perder-se nos pensamentos como há tempos não acontecia; seria uma tentativa de flanar. Como a minha caminhada tinha um certo sentido, um motivo, um "objetivo", a ligação com o flaneur estava em tentar aproveitar a caminhada, sem pressa, fazer o caminho que fosse, mesmo não sendo o mais curto, mas tendo em vista o caminhar em si.


Desde que comecei, a lua já havia chamado-me a atenção; brilhava de uma forma atraente, parecia estar mais próxima do que o comum, como se um cíclopes gigante observasse toda a atividade humana.
Você podia ser rico, ser pobre, ser solitário, ser popular, altruísta, egoísta, órfão, avô, patrão, empregado, etc., podia ser quem fosse, ter a visão que tivesse, a lua brilhante e reluzente não deixava de brilhar por causa disso.

Se por algum acaso sua visão transcendesse sua individualidade, se sua visão deixasse de ser mais um ponto de vista, mas se aproximasse daquela essência irredutível; que observasse aquela espécie de centelha que move a tudo e a todos. Você se identificando no mais simples grão largado no meio da rua, na mais simples planta lutando pela sua sobrevivência ao buscar água no subsolo, naquela pessoa, que brava, amaldiçoa o mundo, e a outra, que serena, dorme confortavelmente.
Você percebe que o sofrimento é geral, e logo, senta empatia, compaixão.

Ao mesmo tempo, por ter-se afastado da individualidade, deixa de sofrer.
Percebe que o mundo é mundo, você é o mundo, a planta é o homem, o homem é você, o grão é o mundo, a lua é a planta; você está em tudo e tudo está em você.

Depois, sua atenção é chamada, você sente-se puxado para a sua condição anterior, volta a querer, sente sede, tem sua visão afetada pelo lado racional e não mais o intuitivo, quer comprar alguma coisa, sente vontade, sente-se mais um no meio do mundo, no meio de tudo, e não mais, tudo no meio de tudo.

Você olha de novo para a planta e estranha, não reconhece mais o grão no asfalto; aquela pessoa brava é uma infeliz, e talvez você sinta-se superior por não compartilhar do mesmo estado.
E aquele "êxtase" torna-se nostálgico e você volta a sofrer.