terça-feira, 28 de abril de 2009

Espaço-Tempo

Sabe aquela sensação que temos que nunca mais vamos rever aquela pessoa desconhecida que está perto da gente em lugares e momentos específicos?

A gente percebe uma diversidade enorme de pessoas, sendo que a única ligação que temos é a coincidência momentânea no espaço-tempo.
Se não fosse por aquele exato momento naquele exato lugar, você poderia nem estar olhando para aquela pessoa, mas para qualquer outra.

E isso não tem nada a ver com o que chamam de "magia do amor", mas é uma magia da probabilidade, do acaso.
Você pode parar a qualquer momento para sentar no banco da praça, e verá que há muitas pessoas, e pessoas diferentes (ou seriam iguais?), e a chance de você trocar alguma idéia com algumas dessas pessoas ou de revê-las, é pequena.
Primeiro porque é uma questão matemática, simplesmente há muitas pessoas e você é só um. Segundo porque atualmente há todo um individualismo exagerado. A lógica capitalista promove a competição entre as pessoas e o comum é "cada um cuida do seu", ou pior ainda, "não te devo coisa alguma". E isso afasta as pessoas quase criando 'muros' entre elas, e de alguma forma, instituições como Família, Igreja e Estado, tomam força segurando as pessoas.

A questão matemática (da probabilidade social, vamos dizer) torna-se mais interessante quando você revê a pessoa em questão, por exemplo, sempre que você passa na frente daquela banca ou pega o ônibus em determinado horário. Você não tem nenhuma ligação com a pessoa (talvez tenha segundo algumas teorias) e só o espaço-tempo de vocês os unem. A pessoa pode ou não ser da mesma classe social que você, pode ou não pensar como você; enfim, são inúmeras possibilidades.

E entre pensamentos dialéticos, aponto para dois caminhos gerais.

Para um deles, cito por cima o 'dilema do porco-espinho'.
O dilema - hipotético - descreve uma situação em que um grupo de porcos-espinhos procuram aproximar-se em razão de compartilhar calor durante o inverno. No entanto, quando alcançado, eles não podem evitar de se machucar com o seus espinhos, então eles precisam afastar-se. Embora eles compartilhem a intenção de uma relação próxima e recíproca, isso não acontece por razões que eles não podem evitar.

Por esse lado, proponho a questão do problema da sociabilidade e certa ênfase no comportamento solitário, por Schopenhauer.
Para Schopenhauer a sociedade age quase como corrompedora do indivíduo. Portanto o insociável seria alguém que não precisaria dela, e para ele, ter em si mesmo o bastante para não precisar da sociedade já seria uma grande felicidade, como tranquilidade intelectual. Citando:

" Pois é na solidão, onde cada um está entregue a si mesmo, que se mostra o que ele tem em si mesmo. Nela, sob a púrpura, o simplório suspira, carregando o fardo irremovível da sua mísera individualidade, enquanto o mais talentoso povoa e vivifica com os seus pensamentos o ambiente mais ermo. "

Epicuro também propõe uma via parecida.
Para ele a felicidade está no geral através do afastamento da dor.
A receita para boa vida dele - tetrapharmakos - diz; " os deuses não são temíveis; a morte não nos traz riscos; não é difícil atingir o bem nem suportar o mal com coragem. "
A filosofia dele é praticamente minimalista, nos dizendo que não precisamos de muito para sermos 'felizes' (coloco as aspas, porque o conceito dele de felicidade obviamente não é o mesmo do senso comum). Só que Epicuro acaba não sendo tão solitário quanto Schopenhauer, para ele a amizade é algo importante, essencial. Como se precisassemos mesmo de pouco, materialmente e socialmente falando. Somente o essencial.

Existe mais um conceito que gostaria de citar, que quase encaixa-se com a parte do outro pensamento dialético. O Übermensch de Nietzsche (Além-Homem para alguns, ou Super-Homem para outros).
O Übermensch é quase uma meta para a humanidade, mas ao mesmo tempo uma crítica.
Justamente onde aponta a meta é a crítica em si. - parte da meta pode ser simplificada com uma superficialidade minha, como a procura de novos valores, quase um ser humano auto-suficiente (não quero me aprofundar muito no conceito, tanto por divergências dos que estudam, quanto a minha própria carência de conhecimento sobre este tema em particular, mas uso uma breve idéia do conceito para contexto no texto) -
Quer dizer que o que acontece não está certo. E esse sentimento pode tanto levar para um afastamento às pessoas, mas ao mesmo tempo um tipo de ativismo, uma proposta de melhora. Você pode querer simplesmente tentar ser esse Übermensch e não se importar com mais nada. Ou procurar formas de propagar o conceito.
O que chega ao outro lado da dialética.

Se por um lado até agora eu estava falando de um retraimento social, agora queria abordar o oposto.

Sócrates também indicava uma 'meta' puramente racional, vamos dizer, à liberdade crítica de cada um. Eu chamaria de ativismo moral-racional. Para Sócrates nós temos responsabilidade de sermos 'filósofos' - seres pensantes - e a moral é repetidamente criticada por ele. Temos essa 'aversão' ao próximo, mas ao mesmo tempo procuramos melhorá-lo, dar condição para 'partar idéias' novas.

Schopenhauer também, indica além da anti-sociabilidade a compaixão humana. Para ele a existência teria como sentido, a dor. E através disso teríamos compaixão com os outros, quase poética, de se temos uma essência igual, sentimos as mesmas dores.

" ... Esse homem, chegado ao ponto de se reconhecer a si mesmo em todos os seres, considera como seus os sofrimentos infinitos de tudo quanto vive, e apodera-se, dessa forma, da dor do mundo.
Nenhuma miséria lhe é indiferente, todos os tormentos que vê e tão raramente lhe é dado amenizar, todas as angústias de que ouve falar, inclusive aquelas que lhe é possível conceber, perturbam-lhe o espírito como se fosse ele a vítima.
Insensível às alternativas de bens e de males que lhe sucedem em seu destino, livre de todo egoísmo, penetra os véus da ilusão individual: tudo quanto vive, tudo quanto sofre, está igualmente junto de seu coração.
Imagina o conjunto das coisas, a sua essência, a sua eterna passagem, os esforços vãos, as lutas íntimas, e os sofrimentos intermináveis; para qualquer lado que se volte, vê o homem que sofre, o animal que sofre, e um mundo que se desvanece eternamente.
E une-se tão estritamente às dores do mundo como o egoísta a si mesmo. "

E juntamente com Sócrates, outro que vai contra o retraimento é Marx.
Cito: "Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo, diferentemente, cabe transformá-lo".
Marx propõe metas, e quer dizer, que não devemos levar uma vida socialmente passiva, mas como Sócrates, ativa (guardadas suas devidas proporções).
Marx tem uma crítica ferrenha de tudo, mas com o ativismo, propõe mudanças. Um futuro em que talvez haja uma libertação de todos os homens.


...


Depois da pincelada aos pensadores, volto à questão do ônibus, do lugar público.

Será que não há uma síntese dessas duas vias?
Acho interessante ambas as vias, considero possível alguém ser anti-social e também ser ativista. Talvez a anti-sociabilidade se encaixe num plano mais íntimo de relação (dependendo de cada um), ou no aspecto de sociedade no geral com suas coerções sociais, suas 'regras'.
A visão de Epicuro, chega a ser minimalista e até individual. Mas acho que com ela, apreciamos o que dizem ser 'as pequenas coisas'; como a amizade e a questão do consumir (não apreciação no caso).
Sócrates e Marx apontam à critica das 'regras sociais'. E Schopenhauer fala, sobre talvez, uma visão mais íntima.

Então, aquela pessoa que você observava - se você também concorda - você pode criticá-la visando à melhora, mas também pode escolher não se aproximar.
Se escolher se aproximar pode não ser exatamente nas vias das convenções sociais e suas regras.

Talvez a questão seja essa mesmo pra mim. Sem uma proximidade geral propriamente dita (que nos tempos atuais torna-se complicada), mas com ativismo-compaixão-empatia entre as pessoas.




OBS: Nossa, o texto ficou grande.. No meio do texto, eu tentei esclarecer alguns pontos dos pensadores, para talvez, ser bem claro e tentar incentivar um aprofundamento sobre eles. Espero que o texto não tenha efeito contrário.

2 comentários:

  1. O Anti-Social busca em si a segurança de seus atos, pois a sociedade, para ele, representa um monstro, uma diferença de ideologias, o perigo! Por isso, perdido entre os próprios pensamentos, ele busca saídas e respostas para algo sem que tenha que contar com a ajuda de alguém. Induzido pela própria sociedade e educação, o indivíduo busca reclusão, assim, acha que poderá evitar problemas e dores cotidianas.

    Eu acho muito interessante esta idéia de socialismo. Não foje daquilo que eu já havia dito:"-O Antissocial busca a reclusão porque tem medo ou o Sociável busca a sociedade porque tem medo?".

    Dilema do porcoespinho.
    Achei bem interessante pois mostra de relance a idéia das diferenças, a reclusão social a partir do medo ao mesmo tempo que haja necessidade, pois o que somos nós senão indivíduos frágeis que necessitam de apoio?

    rÊ.

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  2. que texto enooooooooorme!!

    mas vou ler!

    parebens pelo blog!!

    e visita o meo!!!

    kiz

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